Hoje, nas “Histórias do Lacerda”, voltamos a dar espaço a duas das minhas coisas favoritas: literatura epistolar e azedume. O que vão ler em baixo é a segunda de uma série de cartas, de remetente desconhecido, que tenciono partilhar convosco. Chamei-lhes “As Novas Cartas Portuguesas (da Sacanice)” não porque sejam remotamente parecidas com as verdadeiras “Novas Cartas Portuguesas”, mas para que, mesmo só lendo o título, percebam que estamos perante um ser desagradável e pouco respeitador do sagrado. Apreciem:
“Tânia (ou Vânia ou lá o que é),
Sempre te tratei como a filha que nunca quis ter. Aliás, fui mais tua mãe que a tua própria mãe. Enquanto eu estava a olhar por ti, onde estava ela? No bem bom! Ali toda esticadinha depois de ser, rudemente, vítima de um Fiat Uno descontrolado.
Enquanto ela te obrigava a gastar dinheiro a organizar um funeral surpresa, eu estava no meu canto. Silenciosamente a apoiar-te e a ajudar-te em tudo e, sobretudo, a não te mandar as despesas que tive na reparação do para-choques. E se o arranjo de um Fiat era caro na altura!!
(Ainda me lembro bem, foram 10 contos. Tive de te cortar nas refeições para pagar o arranjo).
Quanto partiste o braço, depois de um terrível acidente que envolveu a minha mão esquerda, um dildo e uma coreografia ousada e sensual ao som do King África, fui a primeira a levar-te a um médico de confiança. E sim, agora, do alto da tua inteligência de menina universitária, podes dizer o que quiseres, mas o Dr. Gomes é tão bom a tratar de braços humanos como de animais. É tudo a mesma coisa. Além disso fazias bem em lembrar-te que foi ele quem te tratou da asma (na única altura em que teres a cara de um Bulldog foi benéfico).
Nem sei para que me dou ao trabalho de te escrever depois do que tu me fizeste. Talvez esta carta seja para mim uma espécie de Paracetamol para a alma. Talvez seja só o meu incorrigível lado maternal, não sei.
Mas quero que te lembres de mim antes de cometeres outra ingratidão.
Lembra-te da pessoa que, durante 18 anos, te fez sentir especial, como o Harry Potter, oferecendo-te generosamente uma despensa para viveres. Lembra-te da pessoa que nunca te cobrou mais do que 25% de taxa de juro em bens que, por serem essenciais, poderia perfeitamente ter esticado o preço.
Lembra-te disso da próxima vez que deres largas à tua maldade e mesquinhez.
Lembra-te disso quando voltares a querer apagar episódios da novela “Sentimentos da Paixão” da minha box.
Vai vestir alguma coisa decente,
A tua VERDADEIRA Mamã”
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