Jogos criados por Inteligência Artificial?
Publicado a 03 Ago, 2023

Uma realidade não muito distante…

Em pleno século XXI, estamos a experienciar uma realidade que até então só vivia no imaginário de alguns livros e filmes de ficção científica. Com a fama ascendente e polarização dos diferentes sistemas/apps de inteligência artificial (IA), possíveis de se instalar nos nossos smartphones, computadores, tablets e afins, abriu-se um novo caminho para o acesso à informação e até mesmo criação de conteúdo. A não ser que uma pessoa tenha vivido numa caverna, sem acesso à internet, já quase todos estamos familiarizados com o conteúdo e aplicações possíveis de usufruir da atual IA. Desde o ChatGPT, Microsoft Bing, WOMBO Dream, Youper e até mesmo o Replika, são exemplos atuais de app’s que podemos instalar livremente e usufruir para diversos fins.

A premissa à qual estávamos habituados a conviver com os sistemas IA era de os ver a efetuar programações e ações básicas, como no comércio eletrónico, educação, estilo de vida, navegação, robótica, recursos humanos, saúde, agricultura, entre outros. Contudo, a partir de 2022, abriram-se novas portas ou caminhos – uma maior possibilidade e capacidade criativa.

Fizemos um pequeno teste. Com uma palavra-chave, pedimos ao sistema para reproduzir “uma pintura de uma paisagem ao pôr-do-sol” e em menos de 1 minuto, o sistema gerou mais de 2000 pinturas, em estilos diferentes, segundo a palavra-chave e designação requeridas. Embora este aspeto, inegavelmente, seja extraordinário, torna-se assustador quando procuramos perceber a forma de como o sistema trabalhou para chegar à criação dessas 2000 imagens. Simplesmente a IA faz uma pesquisa abrangente, mas rápida, após dado o comando, de vários artistas e tipos de desenhos, pinturas, gravuras, entre outros, de paisagens com o pôr do sol, apropriando-se dos mesmos e recriando algo segundo os elementos que pesquisou. De forma literal, o sistema IA é capaz de perceber as técnicas observadas, na internet, e consegue produzir algo, segundo o mesmo estilo. A imagens em baixo são exemplos do resultado do nosso teste.

Logo aqui apercebemo-nos uma questão ética e até mesmo moral no que toca ao processo criativo artístico. Até que ponto, usar um sistema IA, para nos auxiliar numa tarefa que envolva a criação de algo, pode ser considerado moral? Estarei certo ou errado se fizer isso para fins artísticos ou lucrativos? Se pensarmos no fator de existirem artistas que dedicam a sua vida a criar conteúdo para outras pessoas ou para se expressarem, certamente que a resposta é obvia à nossa questão. Recordemo-nos de como em 2022, deu-se o enorme protesto de artistas que inundaram a plataforma ArtStation com a imagem de protesto “No To AI Generated Images» e de como disso fez com que o IA não conseguisse gerar imagens. Tocamos assim num dos pontos negativos do uso de sistemas de IA para o processo criativo. O recurso à máquina para substituir o humano, num dos aspetos que nos dá identidade enquanto seres racionais.

Por sua vez, expandindo ainda mais o nosso ponto de vista e exemplo, recordemos o caso da música Lost dos Linking Park (2023), uma música gerada por AI. Pegando em fragmentos de uma letra escrita pelo cantor Chester Bennington, que infelizmente nos abandonou em 2017, o sistema apropriou-se de fragmentos da sua voz e interpretou a musica à sua maneira, dando-lhe o toque do mais bruto e profundo estilo dos Linking Park. Controversa, a música é tocante, impactante (fazendo qualquer fã da banda chorar) e gerou imensa polémica, mais uma vez, por questões morais e éticas, uma vez que possibilitava o reviver de uma voz (pessoa), de criar uma nova música e até mesmo de planear o videoclip.

Contudo, mais do que abordar questões éticas, morais e pontos negativos, devemos também olhar para os aspetos positivos! Ainda este ano, a Ubisoft anunciou o modelo de trabalho Ubisoft La Forge. Além de humanizar a árdua tarefa de realizar videojogos, de forma a mitigar o “trabalho escravo” dos trabalhadores e criadores de conteúdo, recorre ao uso do Ai Ghostwriter Demo. Um sistema que permite gerar respostas rápidas aos NPC’s criados para os diferentes jogos com uma complexa mecanização de autonomia, segundo as respostas e ações dadas pelo jogador. Segundo os trabalhadores da Ubisoft, o sistema permite agilizar tempos do trabalho, aumentando a produtividade e permitindo que estes possam dedicar mais tempo a elementos que requerem maior atenção e cuidado. Neste sentido, deixam o sistema trabalhar na escrita de segundo e terceiro nível do jogo (escrita não fundamental para a história), enriquecendo o jogo. Recordemo-nos que, nos dias de hoje, muitos jogos são lançados em condições deploráveis, cheios de Bugs e com imensos problemas, que são fruto das pressões e dos cronogramas apertados no ato criativo dos jogos. Os sistemas AI vêm assim agilizar melhor esses tempos, melhorando e até mesmo “polindo” os jogos.

Por sua vez, não são só as grandes empresas que beneficiam da utilização destes sistemas. Segundo Shahid Ahmad (Indie Game Developer), este afirmou na GI, que a utilização das ferramentas proporcionadas pelos sistemas IA vão permitir às pequenas empresas efetuar tarefas no processo criativo de jogos de forma mais rápida, polida e quase perfeita. Dá depois o exemplo de como um sistema IA pode perfeitamente preencher um vasto campo com vegetação, enquanto o programador e artista trabalham em personagens e elementos para o mesmo jogo.

Como exemplo mais recente de como o sistema IA pode elevar e aprofundar a nossa experiência gaming, fazemos menção a um moder, designado de Art from the Machine, que conseguiu implementar o ChatGPT no jogo The Elder Scrolls V: Skyrym. O mod permite que o jogador, com a sua voz ou escrevendo, faça perguntas aos diversos NPC’s do jogo e estes, segundo a Lore e a nossa questão, gerem uma resposta. Deste modo, com uma “simples” brincadeira é possível ter sempre respostas diferentes, tornando o jogo numa experiência sempre diferente.

Neste sentido, temos assim o lado bom e o lado mau da Inteligência Artifical. A discussão do que se deve e não deve fazer da mesma, por ventura, está ainda longe de terminar, pois só agora começou.

É de recordar que segundo a empresa Statista, a receita do mercado mundial de software de IA deverá chegar a 126 bilhões de dólares até 2025. A Gartner estima que 37% das organizações implementarão IA para serviços administrativos, sendo que a percentagem de empresas que empregaram IA para a sua gestão cresceu 270%, entre 2019-2023. De acordo com a Servion Global Solutions, até 2025, 95% das interações com clientes serão alimentadas por IA, prevendo um crescimento do mercado global de software AI de 54%, que faz um total de 22.6 bilhões de dólares.

Todos estes números e exemplos são indicadores assertivos que o mundo dos videojogos, como o conhecemos, irá sofrer alterações significativas, das quais não nos é possível compreender nem os limites nem a total dimensão do seu uso futuro.

Escrito por:
Francisco Costa
Um apaixonado pela cultura Geek que adora tecer comentários e criticas às mais novas formas de arte! Sou uma pessoa um pouco reservada, mas sempre pronto para debater, por largas horas (ou em escassos minutos) qualquer assunto!. Tenho como hobbies favoritos o desenho e a fotografia de rua.