Metal Gear Solid
Publicado a 25 Mar, 2024

Revisitar um clássico

Para uma certa geração, o final dos anos 90 parece que foi ontem, mas a verdade é que 1998 já lá vai há 26 anos. Foi nesse ano que o mundo viu chegar Metal Gear Solid à primeira PlayStation. Joguei-o na altura e é, sem qualquer dúvida, um dos jogos que mais me transformou como jogador. Foi o grande responsável pela popularização do género de jogos furtivos/stealth, com a sua entrada triunfante no mundo da ação de espionagem tática. Sim, há um antes e depois de Metal Gear Solid na velhinha PS1. Como foi voltar agora à obra adorada de Hideo Kojima numa sociedade em que a tecnologia deu passos gigantescos nas últimas duas décadas?

Imagem: Metal Gear Solid/Konami.

Não se enganem. Esta versão, incluída na Metal Gear Solid: Master Collection Vol. 1 é literalmente uma emolução da versão PS1. Embora isso não tenho agradado a todos os jogadores, devo confessar que neste exercício de voltar ao passado, para mim foi excelente ter acesso à versão original, sem qualquer alteração.

Imagem: Metal Gear Solid/Konami.

Como nos filmes

A nossa memória prega-nos muitas partidas e podia jurar que os personagens do Metal Gear Solid que joguei lá em 98 tinham animações faciais nas cinemáticas. Mas não tinham. Nada mexe nestas caras. E isso diz-nos muito do poder que o voice acting dos atores teve (e continua a ter) no contar desta história, cheia de reviravoltas e revelações dramáticas. De resto, os planos visuais, a colocação da câmara, a banda-sonora muito fora da caixa para a altura (e ainda hoje) contribuíram para nos deixar essa imagem vincada de que aqueles personagens tinham mesmo expressões, sentimentos e uma atuação digna de prémios. Aqui está a prova de que limitações técnicas jogam muitas vezes a favor dos criadores, pois obriga-os a puxar totalmente pela criatividade.

O génio de Hideo Kojima já aqui se fazia sentir e é incrível rejogar esta obra e perceber todas as nuances impostas pela seu criador e equipa criativa. Um pensamento recorrente enquanto rejogava Metal Gear Solid agora foi “metade dos jogos hoje, com tanta tecnologia à disposição, com personagens que visualmente parecem saídos do maior blockbuster de Hollywood, não consegue transmitir-nos tanta emoção…”.

Dá que pensar. Há quem diga que Metal Gear Solid foi o jogo que deu verdadeiramente início à aproximação dos videojogos ao cinema, trazendo uma experiência absolutamente cinemática, e é impossível não refletir sobre isso enquanto vemos esta dramatização da vida de Solid Snake e companheiros.

Imagem: Metal Gear Solid/Konami.

Romper barreiras

Hoje em dia é quase impensável fazer uma apresentação de Hideo Kojima, pois só o nome carrega já tanta história, mas, lá nos finais dos anos 90, a realidade era outra. No entanto, Metal Gear Solid traz tanto Kojima imprimido em si que, em retrospetiva, pareceu funcionar como um aviso da revolução que chegaria com os jogos seguintes. Este vai além da barreira entre ecrã e jogador, recordemos que eram ecrãs mesmo pequenos na altura e não TVs 4K de 55 polegadas como esta onde o rejoguei agora. Ora, há imensos momentos em que a ligação entre a própria consola, o comando e o jogador é desafiada. Sem entrar em muitos detalhes para não estragar a experiência a quem nunca se aventurou por aqui, há um momento em que temos que trocar o comando da port 1 para a port 2 (nas consolas atuais, por serem comandos sem fios, isso é feito com recurso ao menu), pois essa é a única forma de impedirmos o nosso inimigo, o arrepiante Psycho Manthis, de nos ler a mente e antecipar os nossos movimentos ao jogar (simplesmente genial). Noutra luta com outro boss, este sabe quantas vezes fizemos save, comenta isso, e volta a quebrar a barreira entre a história e quem está a jogar… e depois entra na nossa consola e faz algo que vai irritar até o mais calmo dos jogadores (a não ser que sejam mesmo fãs de roguelikes). Outro momento pede-nos para encostarmos o comando ao nosso braço (na vida real, digamos assim, fora do ecrã), pois este vibrará e irá assim concertar o nosso braço magoado após uma luta (uma espécie de magia). Na altura, o comando DualShock da PlayStation estava a revolucionar o mercado com a sua capacidade vibração e a equipa da Konami fez questão de usar e abusar dessas possibilidades.

É impossível, mais uma vez, não fazermos pontes para os videojogos modernos, em que, talvez por já termos tantas coisas dentro deles, estes momentos, até um pouco ridículos mas absolutamente deliciosos, tenham deixado de acontecer. Lá está, a quanta criatividade obriga a falta de outros recursos.

Imagem: Metal Gear Solid/Konami.

Regresso ao futuro presente

Será estranho que Metal Gear Solid pareça ao mesmo tempo tão nostálgico e tão atual? O tema central do enredo, a ameaça nuclear, parece mais moderno do que nunca. E há um tom de aviso presente que parece ter sido ignorado pela sociedade (para não variar). Neste caso, há um certo pedido urgente de desarmamento nuclear para o bem da humanidade. Assim que o jogo termina e os créditos rolam, principalmente depois da post-credit scene com uma revelação explosiva, fica a ideia de que pouco mudou em 26 anos. Se abrirmos agora as notícias, lá está a mesma ameaça nuclear russa que afrontou Solid Snake em 98, lá está a mesma maquinação dos governos mundiais que jogaram com as vidas destes personagens na viragem do milénio, na tal consola de jogos que era apenas um brinquedo inocente. Pensámos nós.

Metal Gear Solid 2: Sons of Liberty (na sua versão HD) é o próximo título desta Master Collection e já está ali instalado à espera de ser jogado. E estou pronto para voltar a vibrar, em todos os sentidos e mais alguns, com a outra obra-prima do mestre Kojima. Será que o tempo lhe fez justiça?

Este artigo foi possível com o apoio da Konami, que nos enviou um código da METAL GEAR SOLID: MASTER COLLECTION Vol.1 para a Xbox Series X|S.

imagem de capa: QuixWare/DevianArt.

Escrito por:
Filipe Branco
Fã de cultura geek em geral, mas é nos livros, videojogos e cinema onde mais me perco. Adoro escrever sobre o que me apaixona e eventos de gaming é comigo. Podem encontrar-me online ou à deriva num dos extensos corredores da próxima Gamescom.