Conhecida como “Lady Gucci” e “Viúva Negra”, Patrizia Reggiani tornou-se uma das figuras mais proeminentes dos anos 90, primeiramente pelo seu casamento com uma das famílias mais famosas e ricas do mundo, e depois por orquestrar o seu fim. Adaptado pelos roteiristas Becky Johnston e Roberto Bentivegna a partir do livro de Sara Gay Forden, Casa Gucci traça o percurso desastroso do romance entre Patrizia Reggiani e Maurizio Gucci. Desde o seu primeiro contacto numa festa milanesa até ao tribunal em que Patrizia se encontra sob julgamento pelo assassinato do ex-marido.
No começo havia paixão. Patrizia conhece o estudante de direito, Maurizio, num baile de máscaras onde o confunde com um charmoso barman e no dia seguinte escreve o número com batom no seu para-brisa. A ideia que nos é transparecida é que esta é loucamente apaixonada por ele, pouco se importando quando este decide abandonar toda a sua fortuna para estar com ela. Maurizio começa com um rapaz quieto e passivo que Patrizia empurra para uma ideia mais ousada de si mesmo. Ele desafia o seu pai aristocrático, Rodolfo (Jeremy Irons), que considera Patrizia uma oportunista social e uma caça-fortunas. Ele não está totalmente errado, mas Maurizio casa-se com ela de qualquer maneira e encontra uma breve felicidade a trabalhar para os sogros. No entanto, quando a oportunidade de voltar para o negócio da família reaparece, esta é a primeira a incentivá-lo a voltar. Afinal de contas, casar por amor é bonito, mas ainda é mais bonito se esse amor tiver a carteira bem choruda.
Interpretada por Lady Gaga, com um sotaque que nada mais faz do que distrair de uma performance em que se vê um esforço imenso por ser algo de interessante, mas que falha na sua maioria, Patrizia vem de uma família de menos posses. O seu pai é dono de uma pequena empresa de caminhões e quando vê uma pequena janela de oportunidade para sair da cepa torta, agarra-a com unhas e dentes. Isto é divertido por algum tempo, habituamo-nos a uma Lady Gaga exagerada que contrasta com uma performance inócua por parte de Adam Driver como Maurizio. Mas o filme tem mais de duas horas e meia de duração – e Gaga e Driver não conseguem aguentar uma química doentia por muito mais do que metade do filme.
A Ridley Scott falta visão e inspiração, o que não é difícil quando se trabalha com um roteiro repetitivo e maçador. A maioria das cenas consiste em Guccis gritando com outros Guccis – ora em Milão ora em Nova York, é esta a única diferença. A espiral psicótica em que Patrízia aos poucos vai caindo é ignorada, e ficamos a desejar ver uma corrida contrarrelógio contra a concorrência que nunca acontece, qualquer menção é rápida e inconsequente.
À medida que o clima muda da comédia sexual para assuntos mais elevados e sombrios – dinheiro, lealdade, honra familiar – Casa Gucci em vez de se aprofundar e ficar interessante, torna-se cansativa e tediosa. A geração mais velha dos Gucci está dividida entre Rodolfo e o irmão Aldo (Al Pacino), que dirige o lado nova-iorquino do negócio. Escolher Pacino e Irons como irmãos é uma jogada inteligente. Um é naturalmente caloroso, o outro consegue ser frio sem sequer tentar, e ambos estão num estágio das suas carreiras em que não conseguem representar mal.
Também à mistura está o filho de Aldo, Paolo, trazido à vida por Jared Leto, cuja ousadia espalhafatosa nos deixa na dúvida se terá sido a mais correta. Parece uma caricatura de mau gosto da ideia italiana na maioria das vezes, mas sendo também o alívio cómico que o filme precisa para que não saiamos da sala de cinema a meio. Na realidade, o que menos funciona é o facto de que cada ator parece estar num estilo de filme diferente. Os maneirismos de Adam Driver poderiam ser excelentes se não estivessem numa versão de Casa Gucci em que Leto ou Hayek (uma vidente com contactos assassinos) atuam de forma oposta, e em que Gaga opera num comprimento de onda completamente diferente. A inconsistência de tom que alterna entre um drama severo e um melodrama exageradamente ridículo, com um senso de humor perverso deixa-nos confusos. Ao que se acrescenta uma banda sonora que parece ter sido escolhida ao selecionar no spotify os maiores hits da década.
O filme resultante perde rapidamente o vapor no seu último ato, ignorando o que poderia ser a parte mais interessante da performance de Gaga. O que não é desculpável, principalmente pelo seu tempo de execução, que assim se torna cansativo e desnecessário. A história perde-se, não há uma intenção ou fio condutor. A cinematografia é confusa, brilhando apenas em breves momentos em que muda para um estilo fotográfico momentâneo, que tornam uma realização aquém num breve instante de interesse. O ambiente é saturado e insonso.
Por fim, a parte em que o filme não falha é, sem dúvida e como não poderia deixar de ser, no figurino de Janty Yates. No entanto, esses visuais são apenas uma espécie de efeitos especiais, elementos que mantêm Casa Gucci de pé quando o filme mal se consegue sustentar, o que é problemático com todos os nomes à volta do projeto. Numa palavra: desilude.
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