Todos nos lembramos por certo de ver na televisão o fumo e as labaredas que devastaram a Catedral de Notre Dame em Paris, como também o desastroso momento da queda do pináculo. Para os mais curiosos, é possível saber agora mais sobre o que sucedeu dentro do edifício através deste quase documentário tornado película. O filme, por Jean-Jacques Arnaud (O Nome da Rosa, Sete Anos no Tibete), segue detalhadamente como centenas de bombeiros combateram um fogo que chegou a temperaturas infernais de 800 °C, num monumento centenário muito mal mantido, dificultando o acesso à origem do fogo, com corredores apertados e escadas estreitas.
A causa do fogo até o dia de hoje não é totalmente conhecida, e é mais do que provável que nunca se venha a saber ao certo. Desde o fatal dia que várias teorias foram criadas, sendo a mais recente a inspiração para este filme pelo diretor francês. Em 15 de Abril de 2019, os seis sinos elétricos (com intenção de serem temporários) instalados no pináculo da catedral mas com cabos que ligavam ao teto da câmara principal, entraram em curto-circuito ao soarem as badaladas das seis da tarde. Uma faísca apenas. Mais do que o necessário para despoletar um fogo que não parava de alastrar. Centenas de anos de negligência e um confronto entre um monumento muito antigo e tecnologia moderna que seria em si não muito recente. O alarme soa, o fumo já se vê à distância mas os bombeiros não são chamados. A cena está montada. De um lado, a donzela em apuros (de estrutura colossal): Notre Dame a ser engolida por labaredas vilãs e arrebatadoras. Por outro, os minúsculos humanos, autênticos “Davides” contra Golias. É uma produção de proporções bíblicas, perfeitamente enquadrada com toda a conotação religiosa ligada não só à catedral, como também às relíquias guardadas no seu ventre. Inclusive o que os crentes acreditam ser a original coroa de espinhos da crucificação de Jesus Cristo. A madeira podre arde facilmente e o chumbo derrete criando buracos nos capacetes dos bombeiros. O edifício ameaça ruir e levar consigo outras estruturas. É urgente salvar a pedra, o ouro, a fé e tentar não matar ninguém pelo caminho.
Jean-Jacques Arnaud trata o fogo como a personagem principal, o que é inteligente por um lado, porque a certo ponto acreditamos que este inferno de labaredas tem realmente vontade própria. Mas pode ser cansativo por outro lado, já que o exagerado foco na pirotecnia não deixa muito espaço ao desenvolvimento das que são de facto as personagens: os bombeiros e os trabalhadores da catedral. Para além do fanatismo religioso, que chega mesmo a ser tedioso, já que ocupa demasiado espaço no enredo, trazendo pouco ou nada à história.
O que faz deste filme possível de aguentar, apesar de muitas falhas no enredo, é a maneira, admito, brilhante como foram incorporadas filmagens originais do acontecimento real.
Infelizmente, o filme cairá no esquecimento como uma fraca produção, onde o verdadeiro horror não é a destruição de um monumento tão carismático, ou até mesmo as centenas de vidas arriscadas nesse dia. Não. O grotesco vilão desta história foi e sempre será o aterrador (e confesso que ainda sinto arrepios só de pensar) trânsito em hora de ponta da cidade de Paris…
Esta análise foi possível com o apoio da Nos Audiovisuais!
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