Sand Land é, mais do que uma boa adaptação, uma fenomenal homenagem a Akira Toriyama! Desenvolvido pela ILCA e publicado pela Bandai Namco Entartainment, o jogo, baseia-se no manga, com o mesmo nome, de 2000. Ao longo da sua produção, a empresa Shueisha, que reserva os direitos do manga, teve também voz crítica na produção do jogo, sendo que isso reflete-se no resultado do videojogo. Segundo a própria Bandai, em 2022, a mesma anunciou o Sand Land Project, que visava a transformação do manga de Akira Toriyama numa nova propriedade intelectual. O mesmo foi oficialmente revelado em Junho de 2023.
Conhecendo de antemão tanto a obra do manga como a sua adaptação animada (disponível na Disney+), podemos afirmar que o videojogo é, em parte, fiel à obra original, adicionando mais conteúdo, permitindo-nos explorar e perder-nos no mesmo.
Como personagem principal, controlamos Belzebu, o príncipe dos demónios, que aliado a Sheriff Rao e Thief embarcam numa jornada em busca da Fonte Lendária de modo a salvar a humanidade de Sand Land da seca e da desidratação. O desenrolar da história acabará por apresentar diversos plots importantes que nos aproximam à própria história das personagens, como nos permitem perceber melhor as suas atitudes, comportamento e crescimento pessoal. Mais do que este fator, devemos também apontar para a qualidade das Side Quests, que não são de todo elementos pensados ao acaso. Encontramos histórias que nos comoveram, assim como outras que nos desenharam um colossal sorriso na cara.
A história é parcialmente fiel ao que assistimos no manga ou série animada. Dizemos parcialmente, pois faz alguns ajustes à linha temporal, e adiciona personagens ao grupo que, por exemplo, só aparecem no início do segundo arco da história “Florest Land”. Contudo, antes que qualquer fã inicie um julgamento precipitado dessa atitude, sem darmos spoiler, afirmamos que as alterações fazem imenso sentido, pois respeitam a Lore e orientação planeada para do jogo.
Inicialmente, pensámos que o jogo iria apelar mais a uma campanha de sensibilização para a importância da água, da terra, e de como uma luta unificada entre seres, pode ser um vínculo interessante para ultrapassar tal problema. Mas mais do que a história de aventura, destaca-se o valor da amizade que surge de onde menos esperamos. Copiando as palavras da personagem Sheriff Rao «O preconceito tolda o bom senso» e grande parte das premissas de Sand Land podem ser resumidas nesta frase.
Para qualquer pessoa que viveu a assistir ao anime Dragon Ball, Dragon Ball Z ou Dragon Ball GT (ou conviveu com esse universo), é impossível não associar o jogo ao estilo de arte que é a assinatura de Akira Toriama. Utilizando o motor Unreal Engine 5, a desenvolvedora teve o cuidado de manter o traço e self-shading de todas as personagens e objetos do mundo de Sand Land sem interferir com a arte de Toriama. Atrevemo-nos até a dizer que tal questão deverá ser tida como exemplo, no futuro, para todo o tipo de empresas que queiram adaptar formas ou estilos muito vinculados a determinados artistas acarinhados pelo público.
Sendo Sand Land um RPG de mundo aberto, a empresa ILCA teve a total liberdade de explorar todos os mecanismos necessários para a criação de um universo sobrelotado de fatores que, direta ou indiretamente, devem estar associados à arte principal. Neste sentido, para o caso do arco inicial de Sand Land, podemos ficar exacerbados com a necessidade de viajar pelo deserto ou de percorrer por trilhos rochosos, tal como no manga/animação original. Os próprios ambientes, captados nos cenários e paisagens do jogo inserem-nos diretamente nesse universo. Perdemos a conta às vezes em que paramos a nossa exploração para só apreciar a paisagem.
Contudo, acreditamos que pela necessidade de prolongar as horas de jogo e de acrescentar mais conteúdo aos mapas, o mesmo ficou sobrelotado de puzzles, baús e de atividades que prolongam a jogabilidade. Não apontamos para isto como um fator negativo, mas sabemos muito bem que o mercado está saturado de jogos em mundo aberto que proporcionam imensa fadiga aos jogadores. Entendemos que a ILCA tentou manter um esforço hercúleo de manter o nosso hype de exploração natural do jogo, mas acaba por recair no mesmo erro de outras empresas.
Importa também referir uma certa desorganização da construção, em camadas do mundo aberto. Mesmo olhando para o mapa, a cartografia não nos permitia distinguir quais os caminhos bloqueados ou formas de contornar determinadas montanhas, sendo que o desenho deveria ter sido repensado de forma a facilitar a leitura da informação prestada durante a sua consulta.
Onde o jogo realmente brilha é nos diversos sistema de combate de veículos. Logo no início da história, somos levados a “pedir emprestado” um tanque que se torna num dos principais meios de locomoção no mundo aberto. Com o desenrolar da narrativa principal, acabamos por desbloquear outros veículos que nos permitem aceder a novas partes no mapa. Cada veículo possui uma manobrabilidade diferente de todos os outros, competindo ao jogador de escolher a melhor opção para derrotar os diferentes inimigos que insurgem no nosso caminho.
É possível, graças à genialidade da empresa criadora, de mudar rapidamente de um Tanque para uma mota, ou de uma mota para um carro blindado, em pleno combate, sem tempos de espera. Tal fator dinamiza a multiplicidade de ações que podemos executar para tornar as batalhas mais intensas ou frenéticas.
Para todos os veículos é possível melhorar as diferentes partes que os constituem, com peças ou objetos que vamos encontrando ao longo da nossa aventura. Os melhoramentos são importantes para evoluir o nível dos mesmos de modo a enfrentar inimigos mais fortes. Mas mais do que melhorar as peças é a possibilidade de mudar a cor ou personalizar por inteiro o veículo, abrindo asas à nossa criatividade e permitindo criar um vínculo único com o mesmo. O que é criado por nós tem sempre outro requinte do que ter algo standard. Por outro lado, importa também referir o impacto das histórias secundárias. Na grande parte, todas elas, embora sendo diferentes no seu âmbito, acabam por recair no desenvolvimento e crescimento da aldeia “Spino”. Na mesma, mais do que ser o porto seguro da nossa aventura, é lugar onde se encontra a garagem (onde criamos peças e veículos), lojas e comerciantes ambulantes. No mesmo, existe também uma casa que nos é dada a decorar a nosso gosto ao mais puro estilo de Animal Crossing. Esta dinâmica de personalização permite-nos dar um toque pessoal ao próprio universo da Toriyama, fazendo-nos sentir integrados ou participativos no mesmo.
Embora Sand Land seja uma interessante adaptação, devemos mencionar alguns problemas que se perpetuam e desvirtuam a experiência do jogo. Mais do que a fadiga do mundo aberto, pelas imensas tarefas a concretizar, apontamos para a fraca opção de luta, corpo-a-corpo entre Belzebu e os inimigos. Com um sistema de skills que parecem dar uma justificação interessante ao sistema de luta, o que se concretiza no jogo é totalmente diferente. Parece-nos que o foco foi destacado para os combates entre veículos, deixando para segundo plano o desenvolvimento das lutas corpo-a-corpo. Tivemos dificuldade em nos adaptar à dinâmica dos veículos para um processo paulatino e moroso dos combates corpo-a-corpo. Mesmo com a personagem principal totalmente desenvolvida, tais condições ainda se mantêm. Devemos inda apontar para alguns bugs ou quebras da luta causadas pela câmara. Sendo um jogo na terceira pessoa, a câmara, nestas lutas corpo-a-corpo tornava-se, por vezes, o nosso maior inimigo.
Por outro lado, devemos também reforçar a questão das falas repetitivas. Acreditando que seja um erro ou modelo que ultrapassou os devs, quando exploramos o mundo aberto, não é nada agradável ouvir as personagens que nos acompanham a repetir, incansavelmente, a mesma frase. Com algum sentido cómico, questionamos até se o problema se tratava de uma questão de amnésia generalizada causada pelo calor.
Embora com alguns problemas referentes à orientação do mundo aberto, Sand Land permite horas de diversão e de aventura repletas de batalhas frenéticas, capazes de desenhar um rasgado sorriso no nosso rosto com a assinatura do saudoso Akira Toriyama.
Esta análise foi possível com o apoio da Bandai Namco Europe!
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