Estes últimos meses têm sido como um daqueles acidentes de viação, em que um carro perde o controlo e mais três ou quatro seguem-lhe o exemplo e fica tudo tão congestionado que não há forma de se escapar. A única solução é ficarmos sentados no carro, aceitarmos que o resto do dia está arruinado e rezar para que dali a umas boas horas já tenhamos deixado aquele pesado para trás.
O problema é que em videojogos, estamos presos neste caos há meses!
Se o assunto é multiplataforma, estamos perante a receita certa para que uma das plataformas, ou todas, venham a ter problemas de performance. Mesmo quando é só numa plataforma, parece que a portátil ali ao lado também nunca ouviu falar de otimização e estabilidade. Não sei que nova pandemia é esta, mas está a arruinar todo e qualquer grande lançamento do último ano.
Após esta introdução, e acreditando que ninguém vive debaixo de uma pedra, acho que não é surpresa quando digo que Star Wars Jedi: Survivor foi a fatalidade mais recente deste drama que nem Eça de Queiroz seria capaz de ter escrito.
Tanto na PlayStation 5 como no PC, plataformas em que tive oportunidade de experimentar, tendo eventualmente escolhido a última, não foi possível pegar neste título durante os primeiros dias. Foi algo desagradável, não só porque foi lançado num fim-de-semana como, para nós portugueses, num fim-de-semana prolongado pelo feriado. Foram vários dias a olhar para o jogo e saber que não estava apropriado para consumo. Com o lançamento da primeira atualização três dias depois, foi-me finalmente possível ter uma experiência aceitável. Durante a exploração e combate havia uma ou outra quebra, mas era raro. Era nas cidades com mais NPCs que sentia uma baixa considerável no número de frames, onde poucas vezes conseguia chegar acima dos 40.
Isto só custou mais porque estava genuinamente entusiasmado por voltar ao universo de Star Wars, ainda por cima numa sequela de um dos Star Wars que mais gostei desde… bem, desde sempre! Nunca entrei muito na onda do Knights of the Old Republic e Jedi Knight tinha sido a última experiência neste universo em que realmente me tinha divertido. Ver chegar este título no estado em que chegou, foi pior do que se tivessem adiado mais uns meses. E deviam ter adiado.
Mas agora que os problemas de performance são apenas um lembrete ocasional durante toda a experiência, três atualizações depois, será que o resto desta aventura esteve à altura?
O começo apanhou-me algo de surpresa. Senti alguma estranheza ao ver Cal Kestis responsável por uma nova equipa, mas ainda muitas horas faltavam e tudo podia acontecer. E assim que o combate e exploração começa, rapidamente me esqueço dessa sensação e aceito tudo o que tiverem para me dar. Se no primeiro título já era incrivelmente satisfatório manusear o sabre de luz e cortar caminho por todo um conjunto de inimigos, em Jedi: Survivor está ainda melhor!
Temos acesso a mais posturas de combate, mas não perdemos o que já tínhamos do passado. Estamos apenas a acrescentar e a desbloquear conteúdo novo, sem nunca nos obrigarem a uma explicação tirada a ferros para justificar já não termos acesso a conteúdo desbloqueado no primeiro jogo. Se antes já era possível otimizar a experiência para a forma que mais gostávamos de combater, agora as hipóteses são ainda mais.
No que diz respeito a exploração, os planetas que podemos visitar têm muito mais área disponível e vamos andar a regressar a eles até bem depois da primeira metade do jogo. Já que até lá não descobrimos todas as habilidades que precisamos para conseguir aceder a todas as áreas de cada planeta. E desvendar o que está escondido em cada canto do mapa continua a ser desafiante, divertido e algo que nunca cansa. Em comparação com outros títulos que nos enchem o mundo com pequenos segredos para descobrir, este consegue tornar a exploração em algo que queremos fazer e não em mais uma tarefa que só exista para prolongar a experiência e nada mais. Não é apenas para ver um número subir.
Podemos dessa forma desbloquear mais pontos de habilidade, assim como cosméticos para o sabre de luz, BD-1, novas roupas, e opções de cor para tudo o que foi mencionado previamente. A novidade é podermos customizar também o próprio Cal, que fica assim mais próximo de algo que nos agrada. E certos cabelos e barbas são um perigo para a temperatura corporal do jogador. Não de mim, eu mantive-me sempre fresco e neutro, nunca tive afrontamento algum!
Enquanto andamos a explorar e conhecer novos mundos, a história vai-se desenrolando de forma natural e a um ritmo bastante bom, ainda para mais tendo em conta que pode ser variadas vezes interrompida por missões secundárias. Mas em momento algum me senti perdido ou aborrecido por isso acontecer. Tudo encaixava bastante bem em toda a narrativa.
Várias caras familiares voltam a marcar presença, e é bom ver a evolução que elas tiveram em cinco anos, salto temporal que existe entre a história dos dois jogos. Porém, ao ver aquilo pelo qual todos passaram e aquilo em que se tornaram, não pude deixar de estranhar como é que certas situações se desenrolaram, que pareceram algo forçadas. Tendo em conta que nos dão o controlo das mesmas, o rumo que lhes damos em nada indicava que o desfecho de cada uma delas ia ser o que foi.
Não divulgando nada do jogo, e usando uma abordagem mais focada na culinária, se estamos a fazer um bolo e não falhamos nenhum passo, bem pelo contrário, a última coisa que esperamos é que quando metemos o bolo no forno à temperatura ideal e com o relógio a cronometrar o tempo certo, que de repente o forno decida não abrir só para que o bolo fique todo queimado. Não havia razão alguma para o forno não abrir. Era novo, sempre esteve funcional, nunca deu problemas, daí que ele do nada funcionar mal não fazia sentido algum. Nem sempre acontece, mas quando acontecia para me arruinar um bolo… quer dizer, para desenrolar a narrativa e ir contra as ações que tomamos segundos antes, este contraste entre o que fazemos e o resultado esperado era demasiado gritante para se conseguir ignorar.
Ainda assim, não foi o suficiente para estragar a história que quiseram contar. Fez tudo consideravelmente sentido e conseguiu superar aquilo que se tem visto nas últimas instâncias cinematográficas deste franchise. Diga-se de passagem, que o conseguiu fazer sem grande esforço. Só precisou de um pouco de… força!
Star Wars Jedi: Survivor é tudo aquilo que se podia esperar de uma sequela: muito mais conteúdo que aumenta a experiência não para ter mais, mas para ser melhor. Visualmente é um salto notável e que mais uma vez acrescenta ao título, dando mais profundidade e emoção ao que vimos no ecrã, seja nos personagens seja nos próprios cenários que nos deixam, por vezes, sem fôlego. A banda sonora continua a deslumbrar e a ser inconfundível, e a jogabilidade abriu as portas a ainda mais possibilidades de abordagem a uma mesma situação por parte de cada jogador.
Infelizmente, tudo o que trouxe de bom ficou manchado por um lançamento paupérrimo, que desiludiu todos aqueles que tinham nem que fosse o mínimo de interesse neste título. Não só fica a perder a Respawn, que vai ter o trabalho dificultado no eventual terceiro título, que agora pode até estar em risco apesar de terem deixado a porta bem escancarada para isso, mas pior, perde toda uma indústria que cada vez mostra menos respeito pelo consumidor e mais preocupação em lançar produtos associados a grandes nomes a troco de um lucro fácil. As coisas têm estado a melhorar para Jedi: Survivor, mas podiam ter logo começado bem não fosse um certo descuido em tentar perceber se o jogo estava apto a ser lançado ou não. Já para a indústria, não me parece que o panorama esteja sequer perto de mudar…
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